É mais do que sabido que a inclusão de mulheres nas empresas pode ser crucial para o sucesso do negócio. Mas no setor de TI sempre existiu um estigma, que passa por questões históricas e culturais, no qual as mulheres não possuem alguns atributos essenciais para atuarem na área de Tecnologia da Informação, o que não se aplica na prática. Assim como os homens, as mulheres possuem qualidades e total capacidade para atuar com sucesso em qualquer setor da TI, desde o desenvolvimento até a área de gestão. 

Segundo o Instituto Ethos, no Brasil, 51% da força de trabalho é feminina e, em cargos de liderança, o percentual é de 38%. Hoje, existem infinitas possibilidades para que uma mulher consolide sua carreira na TI; apesar da área técnica ainda ser um terreno masculinizado, pode-se ver hoje uma boa evolução feminina na ocupação de cargos de liderança. Em entrevista, Jéssica Garcia, que atua há 20 anos no mercado de TI, e hoje ocupa o cargo de diretora de RH da VERTIV LATAM, empresa global que emprega cerca de 20 mil pessoas, 18% são são mulheres. Nos últimos 12 meses, 15% das contratações da Vertiv Global foram mulheres. Na Vertiv LATAM 50% dos líderes regionais são mulheres. Leia a seguir.

DatacenterDynamics: Quais são as barreiras que as mulheres têm que transpor para entrar e se consolidar no mercado de TI?

Jéssica Garcia: Muitas mulheres continuam acreditando que o mercado de TI seja principalmente para homens. Então, apesar de nos últimos anos ter ocorrido uma abertura muito grande à recepção e ao desenvolvimento das mulheres, são poucas as que se prepararam para esse campo.

A indústria está muito aberta para receber os melhores talentos, sem importar o gênero. Ainda assim, nos deparamos com o desafio de haver pouca disponibilidade de mulheres com a formação e a experiência necessárias para ocupar estes cargos.

Então, acredito que precisamos trabalhar com as mulheres desde crianças e ensiná-las sobre toda a variedade de carreiras que estão disponíveis; motivar seu gosto pela matemática, pela engenharia e pela ciência, para desenvolver mais nas mulheres esse desejo de entrar para este segmento.

Uma barreira que acho importante destacar é o gap geracional, ou lacuna geracional. Por muitos anos, a indústria de data centers trabalhou com homens. É difícil que uma pessoa de uma geração como os babyboomers, que durante 20 ou 30 anos trabalhou neste ambiente cercado de homens, queira mudar agora. Falo, por exemplo, dos técnicos de serviço, ou dos técnicos que estão em campo. São times que trabalham de uma forma específica há muitos anos. Isso é difícil de mudar. Décadas atrás não era comum que mulheres se integrassem a quadros de trabalho que exigem esforço físico e o deslocamento de um site para outro. É preciso uma mudança cultural para reduzir essas lacunas de forma a contar com times mais diversificados.

DCD: Por que as mulheres ocupam menos cargos técnicos e marcam mais presença em áreas mais gerenciais?

J. G.: Nos níveis gerenciais podemos encontrar suficiente talento, preparo e competências para ocupar esses cargos. No nível técnico, há falta de oferta para ocupar determinados cargos. Então, é aqui onde precisamos trabalhar e, nesse sentido, estamos agora começando a desenhar um programa através da ESG (Governança Ambiental, Social e Corporativa) para saber como podemos desenvolver parcerias com algumas organizações sem fins lucrativos para começar a fomentar o tema da educação. Nos cargos técnicos temos sim mulheres, mas essa população ainda é muito pequena. Isso acontece não porque não queiramos contratar mais mulheres; é porque não há disponibilidade de pessoas capacitadas e com experiência o suficiente para esses cargos.

DCD: Você pode dar exemplos de quais competências são necessárias para essas posições?

J. G.: Quando falamos da área técnica, primeiramente buscamos engenheiros elétricos, técnicos de ar-condicionado, técnicos mais focados em serviços. Então, nessas áreas temos poucas mulheres. Nas áreas de supervisão, planejamento, aí pode haver um pouco mais e já contamos com algumas profissionais nessas posições. Mas segue sendo difícil encontrar profissionais com as competências técnicas – conhecimento que muitas vezes vêm das carreiras em engenharia – para que se possa realizar, por exemplo, manutenção nos sites do cliente, manutenção de equipamento, instalação de equipamentos e manutenção de projetos.

DCD: Existe igualdade salarial entre homens e mulheres no mercado de TI?

J. G.: Na Vertiv, quando avaliamos uma posição, avaliamos o alcance de mercado, a responsabilidade que a pessoa terá na posição e, a partir daí, determinamos a faixa salarial. Isso independe de a pessoa ser homem ou mulher.

Quando vamos fazer uma oferta, aí temos outros fatores: Qual a sua experiência? Já exerceu essa responsabilidade antes? Qual a sua remuneração atual no mercado? Como está posicionada? Qual potencial enxergamos nessa pessoa? Com base nisso, são feitas as ofertas.

É importante compreender que cada um é dono do seu próprio desenvolvimento. Sim, a empresa apoia e contribui com esse desenvolvimento, mas a pessoa precisa ter interesse em se desenvolver, em estudar, em se preparar, em se voluntariar para um novo desafio. Muitas vezes surgem oportunidades de projetos internacionais, mas nem todos os colaboradores se interessam por isso. É importante que as pessoas – de todos os gêneros – sejam proativas em relação às suas carreiras.

O avanço na carreira é feito em parte pelo perfil da pessoa, em parte pelas oportunidades que existem na empresa. Na Vertiv, por exemplo, temos acesso a mais de 50 mil cursos on-line. Na América Latina, também estamos desenvolvendo plataformas para aprender idiomas. Temos 9 idiomas disponíveis. Obviamente, nossa prioridade são os idiomas da região: inglês, português e espanhol, mas há a possibilidade da profissional aprender outros idiomas. Os cursos são oferecidos de forma privada – se quiser participar, ajudamos a pessoa a desenvolver planos de treinamento. Porém trata-se de uma estrada de mão dupla. A organização facilita o acesso a ferramentas e oportunidades, mas a pessoa precisa procurar as oportunidades, aproveitá-las e desenvolvê-las. Pois é isso que buscamos, uma relação de ganha-ganha com nossos colaboradores.

DCD: A equação mulher em TI + liderança e equiparação salarial, essa é uma realidade que se aplica ao Brasil e à América Latina?

J. G.: No caso da Vertiv, sempre avaliamos a pessoa conforme o mercado, conforme a responsabilidade da posição, as competências. Isso independente de gênero. É com base na experiência, nas competências e a partir dos referenciais do mercado.

Em relação à liderança, creio que ainda temos muito a desenvolver no Brasil e no resto da região. Na Vertiv, com a transição que fizemos para “One LATAM” – em que as fronteiras entre países foram derrubadas e os times se organizam por áreas de negócios – esse é um ponto fundamental para nós. Buscamos a integração cultural, mais do que a inclusão de gênero. Creio que em relação à inclusão de gênero estamos indo muito bem. Temos equidade salarial e de oportunidades.

DCD: A mulher está em desvantagem em relação ao homem que ocupa o mesmo cargo?

J. G.: Em termos gerais, isso é mais uma percepção do que a realidade. Há indústrias muito “masculinas” – como a financeira, automotiva ou elétrica, justamente as verticais onde trabalhei ao longo da minha carreira. Nesse segmento, em geral a percepção é de que a mulher está em desvantagem. Eu não vi essa desvantagem. As oportunidades existem, mas é necessário que as pessoas as agarrem e desenvolvam todo o seu potencial.

Se a profissional pedir ajuda, terá ajuda. A questão é como fazê-lo de forma efetiva e eficaz e como cada pessoa se dedica para conseguir esse desenvolvimento. Alguns preferem ficar em sua zona de conforto, permanecer low profile. Outros buscam oportunidades para se desenvolver mais.

DCD: Como você avalia o plano de carreira na Vertiv para as mulheres?

J. G.: Acredito que há muitas oportunidades para as mulheres na Vertiv. Há espaço para quem quiser se desenvolver, quem quiser crescer. É preciso que a pessoa coparticipe desse desenvolvimento e participe dessa evolução. Não é porque alguém tem 30 anos de casa que será promovido a diretor. Tudo é baseado em mérito, em oportunidades e, no caso específico da Vertiv LATAM, em como trabalhamos de forma coordenada e colaborativa em toda a região. Há muitas oportunidades para trabalhar em diferentes países, com diferentes culturas. Creio que algo super positivo na Vertiv é que sempre estamos buscando inovação e mudanças. Valorizamos a criatividade para fazer algo melhor, algo novo. Então, sempre se abrem oportunidades porque sempre estamos abertos para evoluir, para desenvolver tanto as pessoas quanto a empresa. E, com isso, antecipar e resolver com eficácia os desafios de nossos clientes.