No mundo todo ainda existem regiões de difícil acesso por terra e de baixa densidade populacional. Algumas dessas regiões têm, nos rios que as atravessam, a única solução para o atendimento das diversas necessidades da população. Uma dessas regiões é a Amazônia Brasileira. Face às grandes dimensões territoriais e sua precária rede de estradas, há uma natural concentração demográfica ao longo das margens dos principais rios, fazendo com que essa carência de estradas seja suprida pelos caminhos hidroviários. 

Na Região Amazônica, a ausência dessa infraestrutura básica se agrava quando falamos das telecomunicações. Em muitos municípios, não há infraestrutura disponível para que serviços comuns, como internet e telefonia celular sejam prestados. E mesmo nos municípios que possuem alguma infraestrutura de telecomunicações, normalmente, os provedores de telecomunicações utilizam links via satélite, que possuem as seguintes desvantagens: custo mensal alto, largura de banda de links limitada; e a latência do link via satélite prejudica o funcionamento de diversas aplicações que necessitam de transmissão em tempo real. 

Para superar a ausência de infraestrutura de telecomunicações, foi idealizado o "Programa Amazônia Conectada", que tem como proposta realizar a conexão dos municípios isolados da Amazônia Brasileira através de fibra ótica.

Uma vez que não há posteamento na floresta, optou-se pelo lançamento de uma rede de fibra ótica no leito dos rios, visto que os caminhos hidroviários são as estradas naturais da região. Além disso, uma rota de cabo ótico, ao longo desses leitos, não causa danos ao meio-ambiente, ao contrário de uma solução com fibra ótica posteada, que levaria a construção de uma estrada através da floresta, causando danos ambientais significativos. 

A adoção do Programa Amazônia Conectada visa, não apenas ser mais uma forma de conexão para a Região Norte, mas, também, estabelecer um novo marco de desenvolvimento do país, através da informação e do conhecimento. Nossa inspiração vem do pioneirismo de um projeto similar que, entre 1895 e 1896, implantou um cabo telegráfico subfluvial ao longo da rota Belém - Manaus. O projeto foi conduzido pela empresa Siemens de Londres. 

Até o momento, o maior desafio para o Programa é atuar em uma área de dimensões continentais e com graves problemas logísticos e de infraestrutura. Nessa circunstâncias, as soluções desenhadas precisam apresentar um alto índice de autonomia para que seja possível entregar serviços com qualidade, sem depender de infraestruturas precárias ou inexistentes.

Um exemplo: é fácil pensar em alimentar uma sala de servidores com energia elétrica local e com redundância via geradores. Na Amazônia não é tão fácil assim. A sala precisa estar vedada contra agentes ambientais: a água por exemplo, que costuma alagar muitas cidades ribeirinhas; muitas dessas cidades possuem energia elétrica apenas em parte do dia, o que gera um problema para a alimentação dos equipamentos; e, uma solução com geradores conduz as seguintes questões: onde armazenar o combustível? Como levar esse combustível? Quem irá abastecer o gerador? Como e quem irá realizar manutenções corretivas e preventivas no gerador?

Sendo assim, o uso de Data Centers Contêineres (shelters) mostrou-se a melhor solução, levando em consideração o custo-benefício. Os data centers utilizados pelo Programa são constituídos de um contêiner com instalações e subsistemas necessários para a manutenção de um ambiente de alta disponibilidade para acomodar equipamentos de missão crítica. Sua estrutura foi projetada para suportar condições climáticas extremas e para operar por períodos longos em caso de falta de energia e oscilação. 

Protegido por tecnologia de ponta e com o apoio de subsistemas de controle, os data centers contêineres já em operação, são autônomos, projetados para serem operados remotamente e controlados por uma equipe central. Essa capacidade de gerenciamento remoto é parte integrante de cada unidade.

Toda essa preocupação com a qualidade da entrega dos serviços de telecomunicações faz sentido, uma vez que a infraestrutura que vem sendo construída pelo Programa representará o único meio de acesso aos serviços públicos e de telecomunicações, por empresas públicas e privadas, órgãos públicos das três esferas de governos, universidades, escolas e uma miríade de outras organizações. 

Como exemplo da robustez da estrutura do data center contêiner, podemos citar o subsistema de energia elétrica, que se conecta à infraestrutura elétrica das cidades atendidas, porém, sem descuidar dos grandes períodos de indisponibilidade elétrica que essas cidades são expostas. Para isso, a entrada de energia elétrica é flexível, de mono a trifásica, para que exista a opção de trabalhar com qualquer rede disponível no local remoto onde os data centers são instalados. 

Toda a energia utilizada passa pelo sistema de controle do data center, sendo monitorada constantemente. Ao menor caso de instabilidade ou falha na alimentação, o sistema passa imediatamente para o sistema de baterias, e dependendo da gravidade da falha (uma falta momentânea até uma quebra de parte da rede local de energia) a Central de Comando poderá, através do software de controle, realizar os ajustes na rede elétrica interna para prolongar ao máximo sua autonomia.   

As baterias do atual sistema possuem vida útil superior a 10 anos em operação constante, e, até o momento, não apresentaram nenhuma falha relacionada à indisponibilidade elétrica.  

Conectando Cidades e Pessoas 

Através do Programa será possível atender comunidades carentes, sem recursos e perspectivas de mudança. O Programa possui cinco Projetos, são eles:

Projeto Infovias: envolve a implantação das cinco infovias que serão construídas pelo Programa (Rio Negro, Solimões, Madeira, Juruá e Purus).

Projeto Gestão dos Serviços de TI: tem por objetivo criar um modelo de governança para a sustentação dos benefícios do Programa. De nada adiantaria criar uma infraestrutura colossal na Amazônia sem que fosse estruturado um modelo para uma futura operação de todo o sistema. Este projeto desenvolveu o futuro condomínio do sistema, estabelecendo regras claras para a gestão de todos os serviços associados aos benefícios entregues pelo Programa.

Projeto Cadeia de Valor: visa deslocar grande parte da cadeia de valor a ser construída pelo Programa para a própria Amazônia, em especial a formação de profissionais necessários para a sustentação dos benefícios e operações de manutenção no sistema. Pretende-se com este projeto gerar empregos e renda na própria Região Amazônica, permitindo que empresas e pessoas da região tenham o know-how necessário para a operação continuada do sistema. 

Projeto Políticas Públicas: tem como meta levar serviços públicos para as populações ribeirinhas, através do desenvolvimento de uma infraestrutura, derivada do backbone principal, em cada município, tornando efetiva a utilização dos novos serviços e alcançando os principais benefícios do Programa: a interiorização de políticas públicas das esferas de governos Federal e Estadual e a inclusão digital das populações indígenas e ribeirinhas. 

Projeto Estrutura de Manutenção: busca modelar e implantar uma estrutura de manutenção para o backbone de fibras óticas que cortam os Rios, viabilizando a recuperação do sistema em caso de falhas. Pretende-se, através deste Projeto, aumentar a disponibilidade do sistema e minimizar o tempo de indisponibilidade dos serviços oferecidos. 

Entregando Benefícios e Alavancando a Região Amazônica

A responsabilidade pela qualidade da entrega dos serviços é grande, e requer um planejamento adequado. Por isso, a utilização de data centers contêineres tem se mostrado como uma alternativa efetiva para a manutenção dos sistemas de telecomunicações em elevados índices de disponibilidade.

Em 2015, implantamos o projeto piloto em Manaus; em 2016, implantamos a rota Coari-Tefé, na Infovia do Solimões e a rota Manaus-Iranduba, na Infovia do Rio Negro; em 2017 já está em execução a implantação da rota Manaus-Manacapuru-Coari, no Rio Solimões; e Manaus-Novo Airão, no Rio Negro. Apenas com benefícios efetivos para a população, o Programa irá ajudar a alavancar a Região Amazônica, tanto do ponto de vista econômico, quanto do ponto de vista educacional, da defesa nacional e da entrega de serviços públicos. 

*Luciano Sales é major do Exército Brasileiro e gerente do Programa Amazônia Conectada.