Em um mundo onde a sustentabilidade e a eficiência energética são preocupações cada vez mais prementes, os data centers desempenham um papel crítico na busca por soluções inovadoras e ecologicamente responsáveis. Nesta entrevista, Alex Santiago de Paiva, Líder de TI na Sicoob, fala sobre a integração de energia renovável nos data centers da empresa, as estratégias adaptativas para enfrentar desafios climáticos e geográficos, bem como os métodos eficazes para monitorar e quantificar o impacto ambiental ao longo do tempo.

Um papo que será ampliado na próxima edição do Connect São Paulo, o maior evento do setor de data centers no Brasil, na seção "DCD>Debate - Estratégias de Sustentabilidade em Data Centers: O que está sendo implementado?", programada para o dia 07 de novembro às 18h45.

No Brasil, os sistemas de energia renovável estão sendo integrados aos data centers para reduzir a dependência de combustíveis fósseis e diminuir a pegada de carbono? Como?

Sim. Com projeções indicando um crescimento exponencial da demanda de energia dos data centers devido ao crescente uso de tecnologias como inteligência artificial, machine learning, IoT, dentre outras, a expectativa é que o consumo global de energia de data center quadruplique até 2030. Diante deste cenário os principais data centers hyperscale do Brasil já fazem uso de energias renováveis, e em grande parte através de usinas de energia fotovoltaica, atualmente nossa 2º maior fonte elétrica do país, conforme dados da Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica). Além disso, as ações regulatórias desempenharão um papel fundamental na maneira como a indústria de data centers no Brasil aborda e implementa iniciativas de sustentabilidade nos próximos anos, muitas vezes seguindo padrões estabelecidos por instituições de alcance global, como o GHG Protocol (Protocolo de Gases de Efeito Estufa, disponível em https://ghgprotocol.org/), que define diretrizes para a neutralidade de carbono, dividindo-as entre os escopos 1, 2 e 3.

Pensando nisso, aqui no Sicoob decidimos enfrentar esse cenário desafiador de crescimento exponencial da demanda de energia dos data centers abordando a nossa matriz energética. Em 2023, inauguramos a nossa primeira usina fotovoltaica. Ao contar com uma fonte de energia interna e renovável, garantimos menor consumo de energia por parte da concessionária local para operação do data center. Isso permitiu com que reduzíssemos a nossa pegada de carbono ao utilizarmos uma fonte de energia renovável.

Quais são os desafios enfrentados ao implementar práticas de sustentabilidade em data centers localizados em diferentes regiões geográficas? Como esses desafios podem ser superados por meio de soluções personalizadas e adaptativas?

Implementar práticas de sustentabilidade em data centers localizados em diferentes regiões geográficas e climas apresenta desafios únicos devido às variações nas condições ambientais e nas infraestruturas disponíveis nos diferentes locais. Neste aspecto, posso citar alguns dos principais desafios e possíveis soluções, que passam principalmente por análises personalizadas para cada caso:

a) Variações Climáticas:

Regiões com diferentes climas exigem estratégias de resfriamento distintas. É preponderante que sejam utilizadas cartas psicrométricas específicas de cada localidade, disponibilizadas pela ASHRAE (American Society of Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers) na avaliação de novas soluções. Os dados das cartas psicrométricas são utilizados não somente na seleção e tipo de condensadores dos sistemas de climatização, mas também na seleção de radiadores dos grupos moto-geradores. Estes dados são também fundamentais nos estudos de viabilidade técnico-econômica de soluções de freecooling. Destaca-se ainda a possibilidade de reúso do calor gerado por data centers em locais de clima frio, sendo possível o uso de trocadores de calor intermediários para aquecimento local ou geração de energia.

b) Disponibilidade de Energia Renovável:

Existem diferenças na disponibilidade de energia renovável, dependendo da região. Por exemplo, em algumas regiões, a energia solar pode ser mais viável do que a eólica, ou ainda, pode ser necessário buscar certificados de energia renovável. Sugere-se avaliar as fontes de energia renovável mais adequadas à localização do data center e integrá-las em um plano de energia personalizado.

c) Regulamentações Locais:

As regulamentações podem variar em cada região, principalmente no que diz respeito ao manejo de água, resíduos da construção civil, resíduos oleosos e à preservação de árvores nativas. É importante que os normativos locais sejam conhecidos e cumpridos, considerando-os como aspectos mandatórios no plano de sustentabilidade das organizações.

d) Cooperação com a Comunidade Local:

Cooperar com organizações locais, governos e comunidades pode ajudar a superar desafios específicos da região e fortalecer a sustentabilidade. É importante que as organizações proponham parcerias estratégicas com entidades locais para compartilhar conhecimentos, recursos e ainda fomentar o desenvolvimento da mão de obra local. Essa abordagem holística traz resultados diretos à neutralidade de carbono do data center, por exemplo, através da redução das emissões de carbono pelo deslocamento dos trabalhadores que moram nas proximidades do data center (escopo 3 do GHG Protocol).

Adaptar práticas de sustentabilidade em data centers a diferentes regiões geográficas e climas requer uma abordagem personalizada e holística, considerando as condições locais e as metas de sustentabilidade específicas. Isso pode resultar em data centers mais eficientes, econômicos e ambientalmente responsáveis.

Quais são os métodos mais eficazes para monitorar e quantificar o impacto ambiental de um data center ao longo do tempo, a fim de implementar estratégias de melhoria contínua e atingir metas de sustentabilidade a longo prazo?

Considerando que a maior fração de energia consumida por um data center é destinada aos sistemas de climatização, as medidas mais eficazes naturalmente se concentram nessa parte da infraestrutura. Neste contexto, é crucial avaliar não apenas o PUE (Power Usage Effectiveness), conforme a norma ISO 30134:2016, mas também parâmetros como a conformidade da temperatura dos racks (RCI - Rack Cooling Index), a eficiência na distribuição de ar (RTI - Return Temperature Index) e o MLC (Maximum Load Component Design), de acordo com o padrão ASHRAE 90.4 - Energy Standard for Data Centers.

Em conjunto, esses parâmetros fornecem informações valiosas para os gestores de data centers sobre os resultados das práticas atuais de gestão de energia. Além disso, por meio de estudos de simulação de dinâmica de fluidos computacional (CFD) realizados por consultores especializados, é possível quantificar os possíveis benefícios a serem obtidos em projetos de aprimoramento.

Além disso, em 2023 iniciamos no Sicoob o processo de certificação CEEDA e já notamos como esse processo nos permite ter insights valiosos ao olhar para dentro de casa. O levantamento das informações requeridas tem permitido nossa autoavaliação e, consequentemente, a partir disso podemos implementar estratégias de melhoria contínua afim de atingir metas de sustentabilidade mais ousadas a longo prazo.